O ChatGPT está nos deixando loucos ou apenas nos mostrando um espelho?

Uma reflexão sobre como a inteligência artificial revela quem já somos.

Homem olhando para a tela de um monitor que exibe um rosto humanoide feito de circuitos digitais, simbolizando a IA como um espelho da consciência.

A tecnologia como um espelho: o que a inteligência artificial realmente reflete sobre nós?

Confesso que tenho pensado muito sobre isso. Desde que o ChatGPT e outras inteligências artificiais entraram de vez nas nossas vidas, uma pergunta não sai da minha cabeça:

essa nova tecnologia está nos enlouquecendo ou ela funciona mais como um espelho, refletindo aquilo que já somos?

Recentemente, li uma reportagem do The New York Times que acendeu um alerta. O texto trazia histórias de pessoas que, de certa forma, pareciam ter perdido o contato com a realidade por causa de chatbots. Gente se apaixonando por uma IA, outros acreditando viver em uma simulação, alguns usando as respostas do robô para justificar atitudes perigosas e até pessoas solicitando opiniões do chatGPT para tomar uma decisão na vida. A narrativa é assustadora, quase um episódio de Black Mirror se tornando realidade.

A primeira reação, claro, é o medo. É culpar a máquina, o algoritmo, a tecnologia que “está indo longe demais“. Mas, logo depois, me deparei com um contraponto do escritor de tecnologia Alberto Romero que me fez mudar de perspectiva. Ele argumenta que o que estamos vendo não é uma epidemia de loucura causada pela IA, mas sim um padrão muito antigo se repetindo: a gente sempre culpa a nova tecnologia pelas nossas velhas falhas humanas.

E, quer saber? Faz todo o sentido.

Romero aponta algo crucial: o jornalismo de hoje, muitas vezes, pega casos extremos e os apresenta como se fossem a regra. É a busca pelo espetáculo. No universo de centenas de milhões de usuários, essas experiências perturbadoras são a exceção, não a norma. O que o ChatGPT faz, na maioria das vezes, não é criar uma ilusão do zero. Ele pega as ilusões, os medos, as esperanças e os delírios que a gente já carrega e os reflete de volta para nós.

É quase como o Espelho de Ojesed, de Harry Potter, que não criava nada, apenas mostrava o desejo mais profundo do coração de quem olhava para ele. O chatbot, de forma semelhante, se torna um eco das nossas próprias mentes. Se alguém já tem uma predisposição a se sentir sozinho, encontrará na IA uma companhia perfeita. Se uma pessoa já flerta com teorias da conspiração, o sistema pode ser manipulado para confirmar suas crenças. A IA não é o veneno, ela é a seringa que injeta aquilo que já estava no nosso sangue.

Até porque já foi provado que a IA generativa está programada para satisfazer o usuário, concordar com ele e se for necessário, mentir para que ele se sinta melhor… É como se fosse um cachorro digital, com amor incondicional ao dono.

Esse pânico em torno da novidade diz muito mais sobre nós do que sobre a ferramenta. Lembrei de como nossos avós falavam que a televisão iria “emburrecer” as crianças, ou como o rádio era visto como uma porta de entrada para influências malignas. Cada nova tecnologia disruptiva passa por esse batismo de fogo, onde projetamos nela todos os nossos medos sociais.

O ponto que talvez seja o mais importante nessa discussão é o da preguiça intelectual. O ChatGPT não está nos tornando mais burros; ele está esfregando na nossa cara o quão pouco pensamento crítico vínhamos usando. Ele expôs a cultura do “copia e cola“, dos trabalhos de faculdade feitos sem profundidade, das redações que valorizam a fluidez das palavras em vez da originalidade do pensamento.

Essa tecnologia não criou o problema, apenas o jogou sob os holofotes, tornando-o impossível de ser ignorado.

No fundo, a questão não é “o que o ChatGPT está fazendo conosco?”, mas sim “o que ele está revelando sobre nós?“. A resposta, para mim, é um pouco desconfortável. Ele revela que, talvez, estejamos mais solitários, mais ansiosos e mais suscetíveis a ilusões do que gostamos de admitir.

O verdadeiro desafio não é regular ou temer a IA, mas usá-la como um convite para nos entendermos melhor. É uma oportunidade para fortalecermos nosso pensamento crítico, para aprendermos a fazer perguntas melhores e, principalmente, para não termos medo de encarar o que o espelho nos mostra. 😉

E você, o que tem visto nesse reflexo?

Referências:

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