Os anos 90 foram, sem dúvida, uma era de ouro para o cinema mundial, com produções que marcaram época e jamais seriam feitas da mesma forma hoje, dada a transformação das normas cinematográficas e do politicamente correto. Um exemplo emblemático é Lua de Fel (Bitter Moon), filme dirigido por Roman Polanski e lançado em 1992. Com sua mistura singular de drama, erotismo e suspense, Lua de Fel é ao mesmo tempo fascinante e perturbador, uma obra que ousa explorar as profundezas do amor obsessivo e das relações disfuncionais.
Em 1995, eu assisti a Lua de Fel pela primeira vez em VHS e lembro de vê-lo repetidamente! Afinal, era meu primeiro contato com a filmografia de Polanski.
Sobre o Filme
Lua de Fel conta a história de Nigel (Hugh Grant) e Fiona (Kristin Scott Thomas), um casal britânico que embarca em um cruzeiro Istambul e Índia para tentar reacender a chama de seu casamento. Durante a viagem, conhecem o casal francês Mimi (Emmanuelle Seigner) e Oscar (Peter Coyote), um escritor paraplégico. Ao perceber o interesse de Nigel por Mimi, Oscar começa a contar, em flashbacks, sua intensa e turbulenta relação com ela. O que começa como uma bela história de amor logo se revela um ciclo tóxico de paixão doentia, humilhação e maldade.
A Trilha Sonora: Emoções em Cada Acorde
Uma das razões pelas quais amo Lua de Fel é sua trilha sonora, que amplifica as emoções e o suspense do filme. Já na abertura, um barco corta as ondas ao som de Vangelis, enquanto Nigel e Fiona surgem na tela, no auge de seus talentos e beleza. Daí em diante, somos conduzidos por músicas icônicas, performances marcantes e cenários deslumbrantes que nos transportam diretamente para as ruas de Paris.
Além de Grant e Scott Thomas, o elenco também conta com Peter Coyote, que entrega uma atuação quase visceral como o amargurado Oscar, e Emmanuelle Seigner (esposa de Polanski na vida real), cuja interpretação de Mimi cria um dos casais mais perturbadores do cinema francês.
Explorando os Limites da Maldade
A relação entre Oscar e Mimi é a essência da narrativa: um amor que se transforma em uma espiral de abuso e vingança, onde ambos se envolvem em jogos psicológicos e físicos que desafiam qualquer senso de moralidade. Polanski, com sua habilidade característica para criar atmosferas densas e perturbadoras, faz um uso inteligente da interpretação de Seigner, que contracena com a intensidade de Coyote em cenas de pura tensão e conflito.
No início do filme, Oscar conhece Mimi em um ônibus. Ao notar que ela não possui um bilhete, oferece-lhe o seu e é obrigado pelo fiscal da companhia a descer do ônibus e pagar a passagem.
Incapaz de esquecê-la, ele a procura obsessivamente pelas ruas e ônibus de Paris até reencontrá-la por acidente em um restaurante. Assim começa uma relação apaixonada, que de início é doce, mas logo evolui para um erotismo extremo, beirando a perversão. Até que, cansado, Oscar tenta pôr fim ao relacionamento, mas Mimi, incapaz de aceitar, se submete a ele de forma extrema para permanecer ao seu lado.
Músicas que Marcam
A trilha sonora é um espetáculo à parte e cada música parece traduzir um pouco da intensidade da relação entre Oscar e Mimi. Entre os destaques estão:
- “Slave to Love” de Bryan Ferry: Em uma das cenas mais memoráveis, Mimi dança sedutoramente ao som dessa música, capturando a essência da sedução e do domínio que exerce sobre Nigel.
- “Never Can Say Goodbye” de Michael Jackson: Em um contraste fascinante, Mimi dança com energia ao som dessa canção, em um momento que ressalta sua vitalidade, uma ironia ao lado decadente de seu relacionamento com Oscar.
- “Hello” de Lionel Richie: O ápice do filme ocorre ao som desta música, em uma cena carregada de emoção que simboliza um momento de revelação para os personagens, marcando uma virada crucial na trama.
Outras faixas, como “Fever,” “Stop” “Sweet Dreams (Are Made of This)” de Annie Lennox, “La Mer” de Charles Trenet, e a tupiniquim “Katia Flavia, a Godiva do Irajá” de Fausto Fawcett, também enriquecem a experiência. Essas músicas não só ambientam o cenário dos anos 90, mas também reforçam os sentimentos intensos e contraditórios que permeiam o filme.
Desfecho Final
O desfecho de Lua de Fel é tão perturbador quanto o restante do filme. Sem dar spoilers, basta dizer que o final amarra perfeitamente a montanha-russa emocional que é a relação entre Oscar e Mimi, deixando o espectador com uma sensação de inquietação e reflexão.
Minha Impressão
Lua de Fel é um filme que desafia o espectador a encarar o lado mais sombrio do amor e da obsessão. A direção de Polanski, aliada à trilha sonora icônica de Vangelis e às atuações intensas do elenco, fazem deste um filme inesquecível. Recomendo a todos que apreciam narrativas complexas e provocativas, capazes de deixar uma marca duradoura.