Apesar de trabalhar no Centro do Rio de Janeiro, algumas vezes eu também trabalho no Leme, um bairro nobre localizado na Zona Sul do Rio de Janeiro. Nos intervalos do expediente, como é um bairro agradável e tem um calçadão com 4 Km de praia, costumo caminhar pelos arredores para interagir com as pessoas.
Nestas caminhadas, notei algo peculiar: algumas das pessoas que aparentemente viviam nas ruas próximas ao meu local de trabalho se vestiam bem se comparados com a população de rua do Centro. Além disso, sempre exibiam uma aparência limpa e cuidada.
Ao iniciar conversas com essas pessoas, descobri que, na verdade, não eram moradores de rua, não no sentido correto da definição. Elas possuíam família, trabalho e residência. O que acontecia era que muitas deles trabalhavam como porteiros, profissionais de manutenção ou assistentes em prédios do bairro. No entanto, preferiam evitar retornar para casa após o expediente, optando por dormir nas calçadas da região.
Essa escolha deles é tomada devido ao deslocamento complicado da Zona Sul do Rio de Janeiro para os locais onde residem, nas Zonas Norte e Oeste. O transporte público envolve múltiplas conexões (ônibus para trem, trem para van), viagens em veículos superlotados e o risco de assaltos durante o trajeto de ida e volta para casa. Além disso, enfrentam o desafio do preço exorbitante das passagens, uma das mais altas do país no estado do Rio de Janeiro. A sensação de segurança e limpeza do ambiente (preservamos o entorno do bairro) também pesava na decisão deles. Essa rotina se iniciava na segunda-feira pela manhã e apenas retornavam para casa no sábado à noite, quando não estavam de plantão.
Permanecendo próximos ao local de trabalho, conseguem economizar dinheiro e tempo, embora para isso tenham se habituado a dormir nas ruas e ficar sujeitos à sorte durante essas noites.
Ao compreender as razões por trás das escolhas aparentemente incomuns desses trabalhadores, vejo uma nova perspectiva sobre as complexidades da vida na cidade. Suas histórias destacam não apenas os desafios logísticos enfrentados pelos residentes da metrópole do Rio de Janeiro, mas também a resiliência e a determinação em enfrentar tais dificuldades. Lembrem, pequenos gestos de empatia e compreensão podem iluminar as vidas daqueles que compartilham conosco essas ruas.